Bispos refletem sobre os urgentes desafios da educação no país

51691356 1970585056322694 8286509605102551040 nUm dos pilares de uma sociedade bem desenvolvida, a educação, foi o tema central da 29ª edição do Curso Anual para os Bispos do Brasil, promovido pela Arquidiocese do Rio de Janeiro, realizado no Centro de Estudos e Formação do Sumaré, no Rio Comprido, entre os dias 5 e 8 de fevereiro.

No encontro, os bispos de todo o país foram convidados a refletirem sobre a temática “Urgentes desafios para a educação no Brasil hoje”. Entre eles, estava o núncio apostólico no Brasil, Dom Giovanni D’Aniello. De acordo com o arcebispo do Rio, Cardeal Orani João Tempesta, “temos a oportunidade de discutir esse assunto que tem uma grande mudança no Brasil, a partir da qual há uma disponibilidade de ouvir a Igreja no que diz respeito à educação. São oportunidades que os bispos têm para ouvir propostas para suas vidas, para a Igreja e a sociedade”, disse.

Um dos organizadores do curso, desde a criação, em 1990, o bispo auxiliar emérito, Dom Karl Josef Romer explicou como se dá a escolha da temática a ser abordada. “Sempre buscamos temas urgentes, ou seja, quais são os problemas para a Igreja do Brasil neste momento? Há muitas coisas, mas demos prioridade para algo que está sendo discutido: a educação católica. Muitas escolas católicas estão sendo fechadas e isso é uma perda muito grande”, esclareceu.

Apesar de o curso ser destinado aos bispos, os vigários episcopais dos diversos vicariatos da Arquidiocese do Rio também estiveram presentes, atentos às principais necessidades e desafios da Igreja no âmbito educacional. Segundo o vigário episcopal para a Educação, padre Thiago Azevedo, “o vicariato, recém-criado na arquidiocese, tem tido essa grande preocupação de reanimar, revitalizar e, sobretudo, enfatizar a missão educadora da Igreja”.

Todas as manhãs do encontro tiveram início com a celebração eucarística e a Oração das Laudes, pela Liturgia das Horas.

Escolas e universidades católicas: ‘olhar a pessoa humana em todas as suas dimensões’

Em suas reflexões, o secretário da Congregação para a Educação Católica, Dom Angelo Vincenzo Zani, abordou os temas: “Da Gravissimum educationis a hoje: temas e documentos do percurso pós-conciliar”, “Orientações do Magistério sobre estudos eclesiásticos: a Constituição Apostólica ‘Veritatis gaudium’ e a Instrução sobre estudos de Direito Canônico” e “A Igreja e as universidades católicas. A constituição Apostólica ‘Ex corde Ecclesiae’ e suas perspectivas hoje”.

Segundo Dom Zani, o objetivo foi apresentar “um quadro geral da situação da educação no mundo, com todos os seus problemas e desafios. Para nós, é importante mostrar uma linha institucional: o que faz a Igreja diante da educação? Quais são os grandes desafios e, sobretudo, qual é o pensamento do Papa Francisco sobre o tema da educação?”, questionou.

O secretário mostrou dados que apontam a existência de 218 mil escolas católicas pelo mundo, com 60 milhões de estudantes, além das 1.865 universidades, com 11 milhões de universitários. “Isso é um discurso importantíssimo para a nova evangelização da Igreja, porque a educação é um instrumento fundamental para anunciar a visão cristã através da cultura e da educação a todo o mundo. Portanto, não nos voltamos apenas aos católicos, mas para todos que estão atentos ao crescimento da pessoa, ao seu desenvolvimento e a fazer com que ela seja protagonista num mundo novo, na cultura de hoje”, explicou.

Dom Zani ainda acrescentou que cada continente vive uma situação específica no que diz respeito à educação, e que na Ásia e no Oriente Médio, por exemplo, as escolas católicas são frequentadas, quase que em sua totalidade (90% - 95%), por muçulmanos. “Isso é um desafio enorme para a Igreja, da qual é exigido dar uma formação cristã. É necessário que a Igreja veja que as escolas católicas e as universidades, em suma, a educação, não é uma coisa fora da pastoral, é uma dimensão dentro da pastoral, porque a educação - no entendimento da Igreja - implica, exatamente, olhar a pessoa humana em todas as suas dimensões”, completou.

Uma educação humanista e integral

O arcebispo de Montes Claros, em Minas Gerais, Dom João Justino de Medeiros Silva, trabalhou a temática: “Rumos da educação no Brasil e a atuação da Igreja”.

Ele deu início à palestra afirmando que, atualmente, não há mais uma proximidade entre a Igreja e escola, tal como nos tempos de outrora. “Boa parte do clero não tem mais acesso às escolas, seja pelo descuido pastoral por parte do clero, seja pelo fechamento e resistência à presença de líderes religiosos no espaço escolar. Os tempos mudaram. A gestão dessa interação pode ser vista como desafio, mas também poderia ser uma prioridade para nós”, introduziu.

O arcebispo também enfatizou as diferenças existentes no sistema acadêmico, e defendeu a importância de uma educação humanista para todas as classes sociais. “Nosso país ainda é devedor de uma tendência de pensar a educação em termos meramente escolares/acadêmicos, com velhas influências positivistas que acabam por seccionar e atribuir a formação técnica para uma grande maioria e reservar a humanista e especializada para uma elite. Persiste uma divisão entre profissões de elite e profissões de massa com larga diferença salarial, que reforça a desigualdade social. Esperemos e trabalhemos para que os pobres não sejam os mais sacrificados. O sonho de uma educação humanista integral está presente em todos nós”, afirmou.

Dom João Justino ainda apontou estas cinco iniciativas como maneiras de contribuir nas ações pastorais diocesanas: reaproximação da escola, zelo para com os educadores, apoio às escolas católicas, organização da Pastoral da Educação e da Pastoral Universitária e a criação de estruturas estáveis de acompanhamento da educação.

Educação, cultura e sociedade

Os participantes também acompanharam a palestra do professor Italo Fiorin, que abordou “Os riscos e os desafios da educação na cultura e na sociedade de hoje” e “Educar à luz da visão do Papa Francisco”. Segundo ele, “o contexto social e cultural em que vivemos e operamos não é um dado imutável, mas um desafio para a nossa identidade como educadores e uma possibilidade que desafia a nossa responsabilidade pessoal e coletiva”, sublinhou.

O professor ainda acrescentou que “educar não é fazer academia, observando o mundo de longe, destilar palavras adocicadas, mas estar comprometido com a realidade. Como podemos aprender com os grandes educadores de todos os tempos e como, incessantemente, o Papa Francisco nos recorda, é dos subúrbios dos pobres e dos desfavorecidos que vem uma lição pedagógica que deve ser ouvida, elaborada e praticada. Uma lição que requer o cansaço da escuta, da pesquisa, do aprofundamento e, também, da teorização, para que não haja muita distância entre a experiência e a conceituação, entre o conhecimento e a vida”, concluiu.

Curso para os Bispos: Igreja e escola

O Curso para os Bispos do Brasil, realizado no Centro de Estudos no Sumaré, contou ainda com a presença do professor Felipe Nery, que abordou os temas: “Problemas do modelo de educação existente no Brasil: qual perfil de pessoas estamos formando?” e “Possibilidade para as escolas paroquiais atualmente”.

Segundo o professor, não há uma resolução das problemáticas que envolvem a educação, porque não há uma busca na raiz da situação. “A mudança de um país não se dá pela área econômica, mas sim a partir de uma educação integral, completa e não um recorte. Busquei apresentar a realidade e os problemas educacionais, com suas causas e origens, porque ouvimos muitas questões, mas as soluções são aparentes, não são propostas de mudanças para a resolução dos problemas. Essa é a consequência de não se buscar as causas. É preciso um diagnóstico fechado”, declarou.

O professor Felipe Nery também acrescentou que cada educador precisa levar aos alunos um fio condutor, que é a verdade. “Além disso, também buscamos levantar algumas possibilidades reais para sair dessa antipedagógica que é vigente. Para evitar problemas, é preciso modificar a visão do processo educacional numa cosmovisão do ser humano, que não é recortável, é completa. A educação católica mostra, ao longo dos séculos, uma qualidade, uma vez que nós temos uma identidade. O objetivo é que as crianças recebam o bem maior, que é a educação em Cristo. O professor precisa de um fio condutor: a Verdade”, disse.

Presença do MEC

No encontro, também esteve presente o secretário executivo adjunto do Ministério da Educação, Eduardo Miranda Freire de Melo, que destacou a importância das Igrejas cristãs no processo educacional. “Pretendemos ajudar e apoiar todas as pessoas e organizações que tenham a educação como múnus principal. Então, a Igreja Católica e as demais Igrejas cristãs cumprem um papel muito importante na disseminação e no formato da educação. A tradição da educação no Brasil passa pela educação cristã, a partir de seus fundamentos, uma vez que o próprio Jesus disse: ‘Ide e ensinai a todos os povos’”, completou.

Sobre o ensino religioso confessional (no qual se trata de uma disciplina para uma crença específica), o secretário evidenciou a necessidade de ouvir a população. “Como sempre dizemos, o estado é laico, mas o país não é laicista, o que temos garantido pela Constituição é a liberdade de credo e de religião. São muitas as instituições que prestam esse serviço à nação e a grande maioria da população é cristã, por isso, ela precisa ser ouvida. Não podemos tapar os ouvidos para as cristãs, ignorando-as por uma questão política e ideológica. Há muito o que aprender, além das trocas de pensamentos, metodologias e o principal: o acesso de todos à educação”, finalizou.

Cardeal Orani João Tempesta

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