A FAMÍLIA À LUZ DA DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA: inspirações para a Semana Nacional da Família 2019

dsi-fotoProf. Ms. Elvis Rezende Messias

O ensinamento e o pensamento teológico da Igreja não se destinam apenas ao campo religioso entendido de maneira reduzida, ou seja, como se lhe interessasse somente a salvação da alma dos fieis. Pelo contrário, a salvação que nos foi conquistada por Jesus Cristo “é uma salvação integral”, de tal modo que abrange a totalidade das dimensões da vida humana (cf. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, n. 1 = CDSI)

Quando a Igreja se pronuncia sobre questões sociais, ela não está se intrometendo em assuntos que lhe são alheios, mas está cumprindo o mandato do próprio Senhor para que fermentássemos o mundo com o poder da Palavra de Deus... Como bem disse o papa Francisco, “já não se pode afirmar que a religião se deve limitar ao âmbito privado e servir apenas para preparar as almas para o Céu” (Evangelii Gaudium, n. 182).

Partindo, então, do reconhecimento de que o Evangelho deve dar a forma de Cristo ao mundo, ciente de que é Ele mesmo a “Doutrina Social de Deus” (FRANCISCO in DOCAT, 2016, p. 12), bem como da centralidade irrevogável do princípio da dignidade da pessoa humana, que permanece sempre “imagem de Deus” em sua essência, e fundamentada nos valores da verdade, da liberdade e da justiça, a Igreja reflete a luz de Cristo aos povos (cf. Lumen Gentium, n. 1), procurando inserir cada uma das realidades sociais em sua perspectiva original, que é o próprio plano de amor do Criador

Dentre as várias realidades sociais iluminadas pelo Evangelho de Jesus, a Igreja dá especial importância à Família: “Iluminada pela luz da mensagem bíblica, a Igreja considera a família como a primeira sociedade natural, titular de direitos próprios e originários, e a põe no centro da vida social... célula primeira e vital da sociedade” (CDSI, n. 211). As Sagradas Escrituras revelam a grandeza e a centralidade da sociedade familiar, manifestando-a como colaboradora direta da ordem do Criador (cf. Gn 1, 27-28), como lugar especial de relação e de complementaridade entre pessoas (cf. Gn 2, 18), como espaço singular do aprendizado do amor e da fidelidade do Senhor (cf. Ex 13, 14)...

Além disso, são abundantes os relatos que aprofundam a dimensão teológica da família, destacando o fato de que o próprio Jesus nasceu e viveu em uma família concreta (cf. Lc 2, 51) e, em especial, a realidade de que Deus mesmo, em seu seio, é comunhão de Pessoas Divinas, Pai e Filho e Espírito Santo (cf. Mt 28, 19; Catecismo da Igreja Católica, n. 253-255). O Mistério da Trindade, como se pode ver, carrega uma dimensão inquestionavelmente comunitária: em seu próprio seio Deus é comunhão, e essa comunhão gera comunidade. A Trindade transborda relação. E, como fomos criados à imagem e semelhança do Deus Uno e Trino, a dimensão social e familiar que possuímos não é uma realidade acrescentada à nossa natureza, mas sim algo que nos identifica singularmente, “uma dimensão essencial e incancelável” (CDSI, n. 384) de nossa humanidade.

Diante de tudo isso, se pode compreender porque razão a dimensão familiar foi elevada por Cristo a grau de Sacramento, pois o Matrimônio é sinal visível da própria comunhão trinitária, do amor incansável de Deus pela humanidade, da revelação do Seu plano de salvação a cada homem e do constante convite que Ele nos faz à comunhão, com Ele mesmo e com os irmãos, numa grande família universal (cf. Dei Verbum, n. 2).

Neste sentido, é indispensável compreendermos que a família “é uma instituição divina que está colocada como fundamento da vida das pessoas, como protótipo de todo ordenamento social” (CDSI, n. 211). Ela se faz, por desígnio do próprio Criador, uma realidade fundamental tanto para a pessoa humana em seu processo formativo e constitutivo, quanto para a própria sociedade em geral (cf. CDSI, n. 212-213). É formidável a afirmação da Igreja que diz: “A família é a primeira ‘sociedade’ humana” (CDSI, 213).

Isso nos ajuda a entender três importantes consequências sociais:

1ª) A sociedade que segue a medida da família tem melhor garantia contra a deriva individualista e/ou coletivista, pois a pessoa é deve ser vista fim, e não meio.

2ª) A família tem prioridade sobre o Estado, devendo este servir à família e promovê-la em toda sua integralidade, e não o contrário.

3ª) A família encontra legitimação na própria natureza humana, e não na concessão estatal.

Assim, a família não é uma realidade passível de manipulação social, submetida a interesses reducionistas de cada tempo e época. É fundamental sim que sejam compreendidos os sinais dos tempos e que a instituição familiar esteja bem inserida nos avanços que a comunidade humana vai conquistando ao longo de sua história, mas jamais à custa do valor originário do projeto familiar no desígnio do Criador. A Igreja entende que existem valores que são inegociáveis, sendo a família o modelo para o mundo, e não o contrário.

“O ponto de partida para uma relação correta e construtiva entre a família e a sociedade é o reconhecimento da subjetividade e da prioridade social da família. [...] O reconhecimento, por parte das instituições civis e do Estado, da prioridade da família sobre qualquer outra comunidade e sobre a própria realidade estatal, leva a superar as concepções meramente individualistas e a assumir a dimensão familiar como perspectiva, cultural e política, irrenunciável na consideração das pessoas” (CDSI, n. 252.254).

Levando em consideração o mistério profundo e maravilhoso que há em tudo isso que refletimos, podemos concluir com o coração cheio de júbilo: “Agradecemos a Cristo que nos revela que ‘Deus é amor e vive em si mesmo um mistério pessoal de amor’ e, optando por viver em família em meio a nós, a eleva à dignidade de ‘Igreja doméstica’. Bendizemos a Deus por ter criado o ser humano, homem e mulher, ainda que hoje se queira confundir essa verdade... Deus ama nossas famílias, apesar de tantas feridas e divisões. A presença invocada de Cristo através da oração em família nos ajuda a superar os problemas, a curar as feridas e abre caminhos de esperança” (Documento de Aparecida, n. 115-116.119). Seguimos firmes proclamando nossa fé no amor de Deus que infunde potência ao amor humano. Seguimos firmes proclamando nossa fé e nossa esperança no mistério da Família. Seguimos firmes, enfim, na fé de que “a família é o santuário da vida” (CDSI, n. 230), construindo a cultura da vida, testemunhando sempre o Evangelho da vida.

 

Referências bibliográficas

BÍBLIA SAGRADA. Tradução Oficial da CNBB. 1ª ed. Brasília: Edições CNBB, 2018.

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. Edição típica vaticana. São Paulo: Loyola, 2000.

CELAM. Documento de Aparecida: V Conferência Geral do Episcopado latino-americano e Caribe. São Paulo: Paulus, 2007.

DOCAT. Como agir? São Paulo: Paulus, 2016.

FRANCISCO. Evangelii Gaudium (24 nov. 2013). São Paulo: Loyola, 2013.

PONTIFÍCIO CONSELHO “JUSTIÇA E PAZ”. Compêndio da Doutrina Social da Igreja. Tradução: CNBB. São Paulo: Paulinas, 2005.

VATICANO II. Documentos do Concílio Ecumênico Vaticano II (“Dei Verbum”). São Paulo: Paulus, 2001.

 

 

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