SEXTA-FEIRA DA PAIXÃO: CELEBRANDO A PÁSCOA DA CRUZ

IMG 0017Sexta-feira Santa é o dia do silêncio e da adoração, dia no qual se medita com a Via-Sacra a Paixão de Cristo e se percorre com Jesus o caminho da dor que leva à sua morte, uma morte que, sabemos, não é para sempre.

A sexta-feira da paixão é um dia que as igrejas ficam silenciosas. Na liturgia há poucos cantos, não se celebra a Eucaristia, porque todo espaço é dedicado à Paixão e à morte de Jesus. Ajoelhamo-nos para simbolizar a humilhação do homem terreno e a coparticipação ao sofrimento do Senhor. Porém, não é um dia de luto, mas um dia de contemplação do amor de Deus que chega para sacrificar o próprio Filho, verdadeiro Cordeiro pascal, para a salvação da humanidade.

O julgamento e a morte de Jesus tiveram como característica marcante um total desrespeito às mais simples regras de justiça. Jesus é acusado sem provas, não tem quem o defenda, é flagelado por ordem de um governador que tinha acabado de dizer que não via nele crime algum. Não é apenas condenado à morte, escolhe-se, com requintes de crueldade, a pior morte possível.  Há, em volta da morte de Jesus, uma espécie de concentração das consequências dos pecados humanos: é a violência no seu grau mais alto.

Deus não programa tal crueldade: Jesus se defronta com o mal que nós criamos. Sofre para nos dizer que ninguém mais deve sofrer. Ao contemplarmos a cruz, reverenciamos o seu sofrimento, talvez compreendamos a necessidade de nos arrependermos dos nossos próprios pecados. É importante fazer isso, mas não basta. O sofrimento de Jesus precisa nos mobilizar diante de todos os sofrimentos humanos: ele continua crucificado em cada direito humano que é desrespeitado, em cada excluído que não tem como se defender.

Na paróquia Santo Antônio em Campanha, a Celebração da Morte do Senhor, tradicionalmente às 15h, foi presidida pelo bispo diocesano, Dom Pedro Cunha Cruz. O Coral Catedral, sempre presente nos principais momentos da vida paroquial, entoou os poucos cânticos permitidos para esta celebração.

A celebração da Paixão

A Celebração da Morte do Senhor, também chamada de Solene Ação Litúrgica, possui uma estrutura diferente da missa tradicional. Não há ritos iniciais; o presidente da celebração, entra, se prostra e faz uma oração.

Na liturgia da Palavra é lido o cântico do servo sofredor, do livro do profeta Isaías e é feita a segunda proclamação da Paixão. No domingo de Ramos, a Paixão proclamada é do Evangelho sinótico do ano litúrgico corrente. Na sexta-feira da Paixão é proclamada a Paixão do Evangelho de João que tem características bem diferentes dos outros três. Apresenta o momento da cruz como a “hora” da culminância da missão de Jesus. Possivelmente por isso, o grito de desamparo (Meu Deus, por que me abandonaste?) é substituído pela entrega (Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito). Também é no Evangelho de João que vemos mulheres ao pé da cruz (não de longe, como nos outros). Entre as mulheres está a mãe de Jesus, que vai ser entregue à comunidade, representada no discípulo predileto de Jesus, que não tem nome no Evangelho, embora a gente tenha se acostumado a ouvir que se tratava de João. Maria, as outras mulheres e o discípulo amado são a semente de um novo modo de continuar a missão de Jesus, por conta da comunidade cristã, da Igreja que vai nascer do evangelho, da cruz, do Espírito Santo. Maria será  mãe e filha da Igreja que nasce. As mulheres, que nunca abandonaram Jesus, também serão uma presença de fé e fidelidade na comunidade.

Após a liturgia da Palavra tem início a Oração Universal. É o grande momento de solidariedade com todo o povo de Deus, nascido do gesto de amor do Cristo na cruz. Como Jesus que “no fim de sua vida terrena fez orações e súplicas a Deus” (Hb 5,7), a comunidade reza pelas grandes necessidades da Igreja e da humanidade. O terceiro momento é o momento de Adoração da Cruz (explanado pelo bispo em sua homilia). E a celebração se encerra com a comunhão. Não há consagração; é feita a distribuição das partículas que foram consagradas na Quinta-feira Santa, na missa da Ceia do Senhor.

Homilia episcopal

“Meus queridos irmãos em Cristo, talvez não tenha lhes falado sobre os sinais da celebração do Senhor que nós podemos observar. Gostaria de sublinhar alguns deles que já foram vistos, mas talvez pouco refletidos. A primeira coisa é que a liturgia recomenda que a partir do 5º domingo da Quaresma as imagens sejam cobertas; na prática muitos sacerdotes o fazem no curso da Quaresma. Após a Santa Eucaristia da celebração de ontem nós desnudamos o altar e fazemos a transladação do Santíssimo para Capela onde os as pessoas passam fazendo adoração na noite de ontem. Hoje é um dia onde é recomendado para o sacerdote não administrar nenhum Sacramento, nem o sacramento augusto, que é a Eucaristia, não é celebrado. Também hoje os sacerdotes não atendem confissão e não administram a unção aos enfermos, a não ser na iminência de morte.”

“O itinerário quaresmal que nós fizemos nos propicia o crescimento na tríplice dimensão: na União com Deus intensificada pela oração e também na vigilância pessoal daquilo que precisamos melhorar para o nosso crescimento espiritual para o caminho da santidade, que é o caminho já indicado pelo nosso santo batismo. Também na sensibilidade para olharmos o Cristo na linguagem do Santo Papa Francisco: tocar a carne de Cristo naqueles que ainda sofrem; nós vamos ao encontro através de um gesto de caridade, que não é um sentimento de pena que nós temos com os nossos irmãos.”

“Por isso nós entramos em silêncio nessa igreja Catedral e o presidente da celebração se prostra em um instante de silêncio e adoração. No silêncio ele deve pensar e agradecer a Deus por ter enviado Seu Filho para nos redimir, nos resgatar, nos salvar. Por isso hoje o Bispo não usa o báculo, a cruz peitoral o anel, em sinal de despojamento.”

“Na primeira leitura, o Profeta Isaías vai falar exatamente isso: Ele foi ferido por causa de nossos pecados. Ele, portanto, assumiu as dores em toda a trajetória de sua vida. Vemos nessa última semana da Quaresma como Jesus vai se preparando para esse momento derradeiro. Assim o profeta Isaías vai descrevendo o caminho do salvador, do redentor, Jesus Cristo. Poucos são aqueles que vão reconhecer o Filho de Deus e o Senhor que vai nos trazer a salvação. Toda a forma de humilhação e desprezo Ele vai abraçar na sua vida, sobretudo, no final.”

“No próprio Salmo Jesus entrega seu espírito ao Pai: ‘Pai em tuas mãos entrego meu espírito’. Isso é uma imagem muito bonita da cruz de Cristo sustentado pelos dois braços do Pai; em cima do Pai, a pomba do Espírito Santo para mostrar que o Filho não está sozinho. Jesus se sente sozinho: Ele se abandona nas mãos do Pai. Aí temos a comunhão da Trindade plena.”

“A carta aos Hebreus mostra a dimensão sacrifical de Jesus, o sumo sacerdote. É aquele homem que entra na parte mais Sagrada do templo para oferecer o sacrifício: primeiro pelos seus pecados; depois pelo pecado da Assembleia. Mas em Jesus isso acontece de maneira perfeita onde ele não tem pecado. Ele se faz Cordeiro,  sacerdote e altar. Somente numa pessoa essa tripla dimensão encontra uma síntese!”

“São Leão Magno no século V, um século depois de São João Crisóstomo, na homilia que ele fez, intitulada ‘De Passione Domini’, faz a seguinte invocação: porque a cruz é fonte de todas as bênçãos e origem de todas as graças. Não é desgraça para nós. É uma desgraça porque é uma pena de morte. Para nós é fonte de graça. Os que iam parar na cruz eram desses desgraçados, esquecidos por Deus, expurgados da sociedade pelas autoridades. Precisamos entender também o sentido histórico da Cruz: quanto mais nós entendemos o sentido histórico da Cruz, mais vamos entender a lógica do amor de Deus presente nessa mesma Cruz. Jesus assume para si toda essa negatividade da Cruz para dar uma característica positiva e transcendente a essa mesma cruz. Ela passa a ser o nosso sinal honroso, não desprezível.”

“Nós estamos celebrando a Paixão de Cristo como momento inerente e fundamental da vida nova que Ele nos dá que não se separa da lógica da Cruz como caminho escolhido por Deus. Nós fazemos uma memória litúrgica da Morte, mas não ficamos presos a esse momento, não ficamos pregados na cruz de jeito nenhum! Para nós a cruz é sinal de salvação e não de morte e de vergonha. Assim como em Adão todos morreram, assim também em Cristo todos reviveram, como diz São Paulo na primeira carta aos Coríntios, Capítulo 15, para sairmos daqui revigorados na nossa fé. Eu recordo o que nós vamos cantar no tempo Pascal: ‘Ó morte onde está a tua vitória? Cristo ressurgiu honra e glória!’”

Você pode acompanhar a íntegra da homilia de Dom Pedro no canal PASCOM Campanha no Youtube pelo link: https://youtu.be/MbuXSnWEMXE

Despedida.

Após a distribuição da comunhão, com as partículas que foram consagradas na missa da Ceia, o bispo faz uma despedida. Não há bênção na celebração, nem canto final. Os fieis mantém o silêncio e a contrição do dia.

Texto: Flávio Maia

Fotos: Bruno Henrique

Reportagem fotográfica completa na fanpage da paróquia

https://www.facebook.com/paroquiasantoantonio.campanhamg/

Sky Bet by bettingy.com